Quem é o mercado?

(Publicado pelo Instituto Liberdade, Instituto MilleniumBem Paraná [28/10/2014], Diário do Nordeste [02/11/2014], Últimas Notícias e Correio do Papagaio [30/10/2014])

Tem sido comum ler em jornais, blogs e outros veículos de imprensa que a reeleição da presidente Dilma Rousseff gera mau humor no mercado. No dia seguinte à eleição, matéria do Estadão tentava explicar o porquê do mercado ter azedado. Conteúdo semelhante fora replicado pela Reuters, Valor Econômico, El País e Globo, entre outros. Uma dúvida fica: quem é esse tal de mercado?

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Engana-se quem diz que o mercado é a bolsa de valores. Ainda que as variações da BOVESPA sejam utilizadas para verificar a evolução do mercado, esta ainda não foi capaz de personificá-lo. Estão igualmente errados aqueles que apontam para o senhor gordo, de terno, cartola e charuto que, nos desenhos e charges, representa o mega empresário, monopolista e detentor dos meios de produção. Esta figura folclórica não existe mais. As grandes empresas têm milhares de donos que nem ao menos se conhecem. As pequenas, por sua vez, são lideradas tanto pela elite quanto pelos mais pobres – principalmente depois do estabelecimento do Micro Empreendedor Individual.

Nas ciências econômicas, o conceito de mercado está relacionado à esfera abstrata onde as trocas são realizadas. Bem como a sociedade é, grosso modo, um conjunto de pessoas integradas por uma cultura, modo de vida ou outro aspecto comum, o mercado representa um conjunto de pessoas que, com objetivos divergentes ou semelhantes, produzem e trocam bens. Em termos mais simples, o mercado é você, seu pai, sua mãe, seus filhos, seu chefe, seus empregados e seus amigos.

Ainda assim, dizer que o mercado esteja de mau humor não significa que, após uma pesquisa do IBGE, percebeu-se que o cidadão médio não tem sorrido ao acordar. Entendendo que um dos princípios econômicos é que as pessoas reagem a incentivos, o mau humor do mercado se relaciona ao fato de que as pessoas, ricas ou pobres, estão com receio de investir pois não sabem se a situação econômica do país permitirá obter lucros.

A eleição de Dilma Rousseff é incontestável. A margem de vitória foi apertada, mas ainda assim garantiu ao Partido dos Trabalhadores mais quatro anos à frente do país. Cabe à governante reeleita mostrar à população que estará empenhada em criar um clima favorável para os negócios, com previsibilidade econômica, menos burocracia e uma carga tributária que não seja impeditiva para o empreendedorismo. Para tal, a presidente e sua equipe econômica devem se lembrar que o empresário do século XXI não é o monopolista de cartola, mas o cidadão médio que, a partir de uma micro-empresa, gera empregos em sua comunidade.

Governo versus empreendedorismo

(Publicado pelo Estado de Minas [05/03/2012], Diário do Comércio, Norte de Minas e Portal Contábil de Santa Catarina)

É interessante perceber o tratamento que cada governo dá para os empreendedores de seu país. Cada um, de acordo com seu histórico político e econômico, requer uma determinada quantidade de taxas e tributos, além de especificidades burocráticas que acabam por interferir diretamente na criação e manutenção de empresas e contratos.

Gregory Mankiw, professor de Harvard conhecido por seus livros-texto em economia, comentou o assunto em artigo recente para o New York Times onde afirmou que o sistema tributário deveria ser algo planejado para atingir objetivos claramente definidos. Nesta e em obras passadas, induz a pensarmos que o jogo político proporciona uma construção aleatória de um sistema que, no final das contas, acaba por unir interesses divergentes em um único código.

Se a afirmação faz sentido para os americanos, onde o tema é recorrente, imaginem no Brasil, onde a reforma tributária nunca saiu do papel. Por aqui, como todos bem sabem, os pequenos empreendedores que conseguem sobreviver em meio a tantos impostos e burocracia são verdadeiros heróis.

Mesmo com a Lei Geral da Pequena e Micro Empresa e projetos como aquele que deu origem ao Micro Empreendedor Individual, as dificuldades para criar e desenvolver um novo negócio são tão grandes que os poucos que se aventuram acabam vendo no governo um adversário mais perverso do que seus próprios concorrentes.

Nos últimos dias, senti na pele as especificidades que diferenciam países com uma carga burocrática extremamente pesada dos que estimulam o desenvolvimento de seus empreendedores.

Como tesoureiro de uma organização internacional sediada em Londres, tive de preparar a prestação de contas a ser entregue às autoridades para que fosse calculado nosso tributo anual – algo que no Brasil demandaria não só um contador especializado, mas também um escritório de contabilidade que tivesse feito todo o controle financeiro da organização durante o ano.

No Reino Unido, quando se faz a gestão de uma empresa regular com faturamento anual inferior à R$17,6 milhões, não existe a demanda pelo profissional de contabilidade nem para a gestão mensal das finanças nem para a prestação de contas para autoridades governamentais.

No caso brasileiro, mesmo que não houvesse esta necessidade, seria praticamente impossível que um pequeno empresário padrão conseguisse entender sozinho todo o sistema tributário a fim de regularizar a situação de sua empresa. Por lá, não bastasse a isenção do contador, as etapas para a prestação de contas são incrivelmente simples e contam com uma série de manuais – e pasmem! Também vídeos explicativos no Youtube – para que qualquer gestor possa executá-las sem maiores problemas.

Ainda assim, para os que tiverem qualquer dúvida, o governo britânico coloca a disposição uma linha telefônica que atende em horário comercial para dar recomendações e esclarecer dúvidas gerais. Ao conhecer tal facilidade, confesso que passei alguns minutos imaginando como funcionaria um call-center similar no Brasil.

Como Mankiw afirmou, “preencher formulários governamentais nunca será algo prazeroso, mas se reformas puderem simplificar os processos, a tarefa pelo menos ficará menos onerosa”.

Em uma economia dinâmica repleta de idéias inovadoras e oportunidades, uma carga exagerada de burocracia não só coloca em dúvida a eficiência das agências governamentais, como impende o desenvolvimento de novos empregos e riquezas. Assim sendo – e tendo em mente o que acontece nos países mais ricos – já passou da hora de se pensar em uma reforma tributária que permita ao cidadão brasileiro colocar em prática todo o seu empreendedorismo que até então foi freado por nossos governantes.