Qual deve ser o limite da participação do estado na economia?

(Entrevista para o podcast do Instituto Millenium)

A parcela da população que, geralmente, é a favor da intervenção do governo em setores da economia, acredita que cabe ao Estado corrigir supostas desigualdades existentes no mercado, como as diferenças de poder de compra dos consumidores de bens e serviços.

No entanto, é importante lembrar que há uma série de fatores que devem ser levados em consideração antes de se afirmar que esse tipo de interferência é de fato boa para o país.

Na prática, as intervenções do governo só se tornam razoáveis quando atuam diretamente para combater problemas de falhas de mercado que sejam muito grandes ou muito emergentes. Não é papel do Estado redesenhar o sistema na tentativa de reparar danos ou interferir na livre concorrência do setor privado.

O economista João Victor Guedes explica que a intervenção do governo deve, de alguma forma, estimular uma disputa de preços. “Já que vamos esperar uma ação do Estado, respondendo a esses problemas emergentes, que pelo menos ela simule um mecanismo de preço onde, em vez de acabar com a competição, tente gerar algum tipo de competição para que a população possa decidir o que é melhor ou pior”, apontou. Ouça o podcast!

No âmbito da redução da desigualdade social, João Victor Guedes destaca que é necessário que se entenda que o papel do Estado precisa ser muito mais voltado para o incentivo do empreendedorismo do que para a regulação ou proteção das empresas, criando oportunidades para todos e gerando renda. “É reduzir as barreiras de entradas, fazer com que mais pessoas com menos recursos tenham condições de abrir suas próprias empresas, de fornecer seus produtos, de inovar”, reforçou.

Aumento da carga tributária

É importante compreender que o Estado não gera renda e que todo o dinheiro arrecadado vem por meio da tributação, então são sempre os cidadãos que pagam a conta. Por isso, é necessário pensar bem antes de querer que o governo faça interferências na economia.

De acordo com o especialista, quando apoiamos uma intervenção ou o crescimento do Estado precisamos responder três perguntas: “A população acredita que os políticos sabem melhor do que ela mesma como gastar seu dinheiro?”; “Quanto dinheiro a população está disposta a dar para os políticos gastarem?”; e “Será que eu, enquanto pagador de impostos, estou disposto a gastar dinheiro com projetos dos outros?”.

Muitas vezes, quando se pensa no pagamento de um imposto, pensa-se também no recebimento de algum benefício. “Precisamos lembrar que quando eu recebo um benefício, provavelmente, houve alguma negociação para que vários outros grupos também recebessem algum benefício. E eu estou pagando por todos eles”, ressaltou.

O aumento da carga tributária pode quebrar uma economia no longo prazo, como é o caso de alguns países que adotaram esse modelo de confiar em um Estado muito grande.

João Victor comenta que se a população não tem tanta confiança nos políticos, nem está disposta a gastar mais, é preciso limitar o poder dos governantes e parar de pedir benefícios para seu grupo específico. “Assim sua capacidade de negociação com a classe política vai aumentar, o gasto público vai ser reduzido e a quantidade de impostos também. Qualquer desajuste nessa demanda da população por mais benefícios e a sua disposição de pagar por impostos vai levar a um desequilíbrio nas contas públicas a longo prazo”, pontuou.

Vale lembrar que não dá para exigir serviços e benefícios sem querer pagar por isso. Dessa forma, a solução pode ser demandar menos do governo e buscar a redução dos impostos.

“Todo mundo está pagando preço reduzido por meio de impostos”

Outro assunto que tem sido muito comentado é relacionado ao aumento dos preços. E a população em geral precisa entender que uma intervenção estatal nessa questão pode piorar o cenário.

“Vimos recentemente o governo tentando controlar o preço da água, do transporte público, do petróleo. Isso num primeiro momento vai levar a um déficit nas empresas públicas ou empresas reguladas pelo governo. Essa perda de lucratividade vai ter que ser coberta de alguma forma. Alguém vai ter que pagar por isso e, geralmente, esse dinheiro virá do governo, que vai ser coberto por impostos. Então haverá a necessidade do aumento da carga de impostos do dinheiro que estamos dispostos a dar para o governo, para garantir que esses preços estejam artificialmente mais baixos”, esclareceu.

João Victor ressalta que o ponto principal que devemos ter em mente quando o controle de preços está nas mãos do setor público é que “todo mundo está pagando preço reduzido por meio de impostos, enquanto essa redução de preços só beneficia alguns setores específicos”.

No caso dos preços, ainda que se espere que o governo possa de fato trazer soluções, o que ocorre, na verdade, é que uma intervenção vai gerar outros problemas que muitas vezes podem ser piores do que os existentes, como a falta de produtos nos mercados, por exemplo.

O desenvolvimento vem do setor privado

É o setor produtivo quem contribui diretamente no crescimento do país, pois aquece a economia, gera empregos, lucros e melhora a qualidade de vida. “O setor privado só gera desenvolvimento econômico. E o papel do Estado em permitir essa contribuição com a economia é tentar possibilitar com que o setor privado atue de maneira mais livre, incentivando a entrada de cada vez mais pessoas nesse ciclo produtivo”, concluiu.

Em linhas gerais, podemos entender que o limite do papel do Estado na economia deve ser atuar em espaços onde ele consiga criar novas alternativas para estimular o empreendedorismo ao invés de restringir a habilidade e a liberdade de competição do setor privado.